sábado, 2 de julho de 2011

Conversas no ônibus....


Outro dia indo para a UFES ouvi um rapaz de aproximadamente dezoito anos dizer a outro no ônibus: "Eu descobri que sou um exímio programador!". O outro não entendeu e pediu que explicasse. O primeiro disse: "Ah tipo assim... eu sou fodaraço!".

O segundo rapaz fez um "hum" de entendimento, mas logo em seguida perguntou: "E o que quer dizer 'exímio' de verdade?", o primeiro disse que tinha que pensar porque "tava na cara!"... o segundo disse "É, você fez Ensino Médio!" e a conversa se desenrolou enquanto o segundo testava o primeiro para saber se aquela palavra realmente existia, pedindo, por fim, "Como se escreve?", recebendo como resposta "Do jeito que fala", e à pergunta "Começa com H?" ele simplesmente disse "Não, é igual exílio, mas com M no lugar do L".

Professora de línguas devo admitir que tive que me conter para não responder a nenhuma das perguntas, por outro lado foi impossível não ouvir com atenção toda a conversa. O primeiro respondia às perguntas do amigo demonstrando muita boa-vontade, confiança e orgulho. Ele não se cansou do assunto mesmo que a resposta "estivesse na cara!", deu exemplos variados de "sinônimos" como "o cara", "muito bom", "ótimo", "o fodão"... E em nenhum momento humilhou o colega por não saber, mas demonstrou grande satisfação por saber responder as perguntas...

Algumas vezes ouvimos colegas de profissão dizendo como os alunos não estão interessados em aprender e como é difícil ensinar essa geração qualquer coisa relevante (e devo admitir que também participo desse coro em dias de TPM ou quando a Lua não está muito bem alinhada), mas ali na minha frente, em pleno horário de almoço, dentro de um ônibus acontecia tudo o que esperamos ver todos os dias em nossas salas de aula: jovens trocando informações relevantes de forma descontraída, sem pressão ou ameaças de prova, por puro interesse genuíno no que poderia aprender!

Saí daquele ônibus rindo sozinha... o menino que perguntava soube conduzir a conversa, fazendo perguntas ideais para guiar o outro a dizer o que ele queria saber e o outro respondia de forma a tanto manter o interesse quanto atender às expectativas de resposta do primeiro. O "jogo de poder" mediado pelo saber ali naquela cena envolvia muito do que sempre dizemos buscar em nossas aulas. Não sei se naquele dia em minha sala de aula consegui chegar a tanto, mas foi muito bom ver Educação acontecendo assim, sem pretensão, no fundo de um ônibus...

Para Ler e Pensar:
VIDAL, Diana G. Michel de Certeau: Historiador-vagabundo, jesuíta-errante. In: Revista Educação - Pedagogia Contemporânea. n. 3 Editora Segmento, 2010.

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